Outras imagens, presentes em periódicos científicos, mostram como serão os úteros artificiais, capazes de gestar um bebê, desde a fecundação, até sua completa formação, sem necessitar de um corpo materno. E mais, esse processo de gestação, hoje futurista, poderia inclusive ser controlado por máquinas e algoritmos, que irão compreender a necessidade de cada feto em receber nutrientes e estímulos físico-químicos. Isso tudo que presenciamos é inovação, e inovação disruptiva, aquele modelo de inovação que rompe com padrões consolidados e apresenta novas propostas, nos fazendo repensar nossa relação com o mundo.
Outras imagens, presentes em periódicos científicos, mostram como serão os úteros artificiais, capazes de gestar um bebê, desde a fecundação, até sua completa formação, sem necessitar de um corpo materno. E mais, esse processo de gestação, hoje futurista, poderia inclusive ser controlado por máquinas e algoritmos, que irão compreender a necessidade de cada feto em receber nutrientes e estímulos físico-químicos. Isso tudo que presenciamos é inovação, e inovação disruptiva, aquele modelo de inovação que rompe com padrões consolidados e apresenta novas propostas, nos fazendo repensar nossa relação com o mundo.
Outro exemplo de inovação disruptiva, que remodelou a forma do ser humano lidar com a realidade, foi a Prensa Tipográfica. Mais que propiciar uma agilidade na impressão de livros, a Prensa Tipográfica, inventada pelo alemão Johannes Gutenberg, em meados de 1450, revolucionou o mundo, impulsionando a ciência e levando a humanidade para o Iluminismo. A invenção da Prensa, como uma forma mais ágil de se produzir e disseminar livros, teve um impacto considerável na política. Os textos e livros produzidos contribuíram, naquela época, para a formação de uma consciência de “Estado”, possibilitando a formação dos “Estados Nacionais” ou “países”, redesenhando a política no território hoje conhecido como Europa.
Trazendo essa discussão sobre inovação disruptiva para os dias de hoje, mais precisamente para o século XXI, e em direção ao século XXV, é o momento de pensar em qual medida a inovação disruptiva tem contribuído para redesenhar o cenário político do mundo, visando como meta uma evolução realmente humana, que favoreça não o acirramento, mas a diminuição das diferenças entre nações, visando repensar relações de harmonia, bem-estar e a consciência de que todos os povos fazem parte de um sistema integrado, habitando um espaço chamado Planeta Terra que, ao menos em tese, é de todos, independente de raça, cor ou religião.
Carros que se locomovem sozinhos, robôs quadrúpedes, que assustam pela capacidade e força daquelas máquinas em executar tarefas praticamente impossíveis a um ser humano, por mais forte que seja um homem, ou uma mulher
Quando ligamos a TV e sintonizamos canais de notícias internacionais como CNN ou BBC, logo notamos, no cenário político internacional, a temática do acirramento das diferenças, que nunca se completa, nunca termina. Cada nação se estrutura em defesa de seu povo, sua cultura, sua história ou sua religião. E embora exista uma instituição internacional chamada Organização das Nações Unidas (ONU), cuja função é ser uma mediadora, as nações parecem estar ainda muito longe de serem de fato “unidas”. É preciso, mais do que nunca, repensar essa ponte com o outro. E compreender melhor quem é esse outro como uma extensão de si. E não como um rival.
Frente a esse cenário, o que de fato poderia contribuir, de forma disruptiva, para um redesenho do modelo político? Será que daríamos conta de remodelar a política a partir de uma grande invenção científica, tal como a Prensa Tipográfica de Gutenberg? Isso parece muito pouco provável. Todas as mudanças, consideradas disruptivas, que remodelaram a política e a economia, aconteceram de forma complexa, não planejadas, durando séculos. Um bom exemplo é a consolidação da ciência como referência primeira para a noção de verdade, o que tirou das mãos da igreja o controle político e econômico, indo resultar, alguns séculos depois, nas duas principais revoluções de nossa história: a Revolução Francesa e a Revolução Industrial. Ambas contribuíram, séculos depois, para fundar as bases do sistema capitalista.
Ao analisar os atuais modelos de inovação praticados em diversos países, em especial nos Estados Unidos, é possível perceber o quanto essa mesma inovação se apresenta de forma “viciada”, porque o modelo continua a servir, pelo menos a princípio, a propósitos capitalistas, mantendo estável a ideologia e o valor do atual sistema.
É fácil perceber essa lógica quando observamos as engrenagens desse sistema, que fez do Uber, do Google e do Facebook, as empresas mais valiosas do mundo. O objetivo central do modelo norte-americano de inovação está atrelado ao acúmulo de capital. O que mais interessa aos investidores de risco e empreendedores é fazer sua empresa se tornar um “unicórnio” (empresa com valor a partir de um bilhão de dólares) ou “decacórnio” (empresas com valor a partir de dez bilhões de dólares). Por outro lado, o modelo político, que rege a maioria das nações desenvolvidas, como China, Japão e Estados Unidos, está enraizado na mesma lógica comercial e industrial.
E em meio a tudo isso, emergem os famosos casos de corrupção, que confirmam, como bem observou o pensador francês Ignácio Ramonet, a visceral relação entre poder político, poder econômico e ciência, a partir da qual é possível colocar em prática a inovação disruptiva. Exemplos de modelos políticos como o brasileiro, o russo e o italiano ilustram perfeitamente esta relação. No Brasil temos a Lava Jato, na Itália, Berlusconi, na Russia, a lógica de Putin não foge à regra. E Putin “inovou”, revelando ao mundo, em 2016, o seu “maravilhoso” Satan 2, um míssel termonuclear capaz de reduzir às cinzas uma área do tamanho da França.
Sendo assim, de qual inovação e de qual política estamos falando? Mais do que vibrar com os projetos do Kickstarter ou das startups do Vale do Silício, é o momento de começarmos a pensar as seguintes questões: para que servem os resultados da inovação disruptiva? Para criar soluções milagrosas que favoreçam seus fundadores, a exemplo do Facebook? Qual a sua relação com a política e qual seu papel? E nesse caso, por mais que Mark Zuckerberg negue, há muitas coisas mal explicadas acerca da relação entre a política norte-americana e a maior rede social do mundo. Por outro lado, redes sociais como o Facebook possibilitam um amplo espaço de diálogo político, como mostram os estudos do pesquisador Pierre Lévy. Mas outros pesquisadores, como Manuel Castells, criticam as redes sociais por oferecerem um espaço mediado pela lógica algorítmica, que determina com quem o usuário se ponto de vista PT-Revista. conecta e qual conteúdo ele acessa ou vê. E isso pode impactar também na política, levando o internauta a se organizar em grupos, porque ele recebe constantemente mais feeds de notícias daquelas fanpages que veiculam conteúdos ligados à forma que ele tem de ver o mundo, suas convicções. Convicções reforçadas a partir da lógica algorítmica.
Será que daríamos conta de remodelar a política a partir de uma grande invenção científica, tal como a Prensa Tipográfica de Gutenberg? Isso parece muito pouco provável.
Um dos exemplos mais expressivos é o da cidade indiana Auroville, uma cidade experimental, onde praticamente não há dinheiro e políticos.
O fato que a lógica da rede social já mudou nossa forma de nos comunicarmos uns com os outros, seja para falar de política, do time de futebol, do gatinho ou cachorrinho transformado em meme. Nesse sentido, a rede social foi disruptiva, porque transformou a comunicação. Mas, ao propor uma dinâmica de aproximação relacional algorítmica, as redes sociais contribuem também para o acirramento da intolerância, o que nos leva em direção ao nosso passado arcaico tribal, época em que víamos o integrante da outra tribo como uma grande ameaça. Isto pode ser facilmente compreendido a partir da teoria do bode expiatório, de René Girard. Porém, isso não significa que a rede social seja um mal a ser erradicado, porque foi através das redes que muitos avanços foram atingidos, a exemplo da legitimação de direitos das minorias como a aprovação do casamento gay, entre outros.
Mais que demonizar a tecnologia, como fez Adorno e Horkheimer em seu livro intitulado “Dialética do Esclarecimento”, a questão principal parece repousar sobre um dilema ético. E este dilema ético deve contribuir para repensarmos os valores atuais e a função da tecnologia, tecnologia esta que deve funcionar como transformadora, em favor do rompimento (disrupção) com modelos degradantes de vida. Modelos esses que tem levado a humanidade em direção ao abismo iminente do total esgotamento dos recursos necessários à vida. E como fazer da tecnologia e inovação aliadas? Através do prolongamento da inovação disruptiva à dimensão da política e da sustentabilidade, mas com outros sentidos e propósitos, que favoreçam a vida em vez do lucro.
Para questões como estas não há ainda respostas simples, dada a complexidade e o tamanho do problema. Mas é possível apontar algumas iniciativas, que vem surgindo como desdobramentos de um novo momento, no qual as sociedades hiperconectadas já sinalizaram demandas por novos modelos de política, e economia, que dêem conta de responder a dilemas cruciais. Um dos exemplos mais expressivos é o da cidade indiana Auroville, uma cidade experimental, onde praticamente não há dinheiro e políticos. As pessoas de Auroville parecem ter descoberto como ser feliz com muito pouco, ou, um pouco que se transforma “em muito” quando se muda os sentidos das coisas. Desta forma, essas pessoas tem contribuído para a criação de uma nova cultura e forma de vida. E uma nova forma de lidar com o próprio desejo.
Frente a esses exemplos, é possível pensar que talvez a maior de todas as inovações não esteja nas mãos dos cérebros de Stanford e do Vale do Silício, funcionando sob um protocolo político que orienta suas ações e expectativas de riqueza rápida e volumosa. É possível pensar que a maior das inovações esteja em uma quebra da lógica desse sistema, ou em uma remodelação do mesmo, como sugere Paul Mason, em seu célebre artigo “The End of Capitalism has Begun” (“O fim do capitalismo começou”), publicado no jornal britânico The Guardian.
Ao repensar os “sentidos das coisas”, e das experiências, pessoas como as de Auroville estão contribuindo para a remodelação de um sistema consolidado desde a Revolução Industrial. Isso é inovação disruptiva! Ao mudarem os sentidos das coisas, essas coisas passam a ter outros valores. Revestidos de outros valores, os desejos são reformulados, orientando ações presentes, que se desdobram para o futuro, mas de outras formas, possibilitando a reconstrução da relação entre seres vivos, planeta e natureza. E isso é também fazer política!
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